O tema produtividade tóxica tem se destacado no mercado corporativo e é considerado um dos maiores desafios enfrentados pelas empresas na atualidade. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2024, cerca de 12 bilhões de dias de trabalho foram perdidos por problemas relacionados à depressão e ansiedade.
No contexto do Janeiro Branco, campanha que promove a conscientização sobre a saúde mental, é essencial que empresas se engajem em ações que priorizem o bem-estar emocional dos colaboradores, criando ambientes de trabalho saudáveis e prevenindo os impactos da produtividade excessiva e das pressões desmedidas.
Nesse cenário, as organizações devem repensar a forma como lidam com o bem-estar de seus colaboradores, para evitar o avanço de distúrbios como burnout, depressão e ansiedade.
Fenômeno multifacetado
De acordo com Adeildo Nascimento, especialista em cultura organizacional e fundador da DHEO Consultoria, a produtividade tóxica é um fenômeno multifacetado que deve ser analisado sob diferentes prismas: econômico, cultural e social. “A questão não é apenas uma moda ou algo pertencente à chamada geração mais nova. Trata-se de um desafio real que afeta todos os trabalhadores, em qualquer faixa etária, e está diretamente relacionado ao modelo de trabalho intensivo e à pressão constante por resultados a qualquer custo”, observa.
Segundo Adeildo, o levantamento da Mercer Global Trend aponta que 82% da força de trabalho global está afetada por problemas de saúde mental, como burnout, depressão e ansiedade. A psicologia social também comprova que o estresse e a sobrecarga de funções cognitivas impactam diretamente a produtividade e a criatividade dos colaboradores, com uma redução de até 30% em sua eficiência quando estão sobrecarregados. Isso cria um ciclo vicioso onde a pressão para trabalhar mais horas acaba gerando resultados negativos, com colaboradores cada vez mais cansados e desmotivados, o que leva ao agravamento do quadro de burnout e outros problemas mentais.
Impactos pós-pandemia
O cenário de produtividade tóxica foi acelerado por dois fatores fundamentais: a ascensão do workaholismo (o culto ao trabalho excessivo) e a estigmatização do descanso. A pandemia e a proliferação das redes sociais exacerbaram essa dinâmica, com um aumento significativo das conexões online. “Após a pandemia, as reuniões virtuais aumentaram em 192%, o que agravou ainda mais a sensação de que os colaboradores estão sempre disponíveis, gerando uma sobrecarga mental. Isso, por sua vez, intensifica o estresse e a produtividade tóxica”, explica Adeildo.
Além disso, a cultura organizacional, especialmente em empresas que ainda valorizam as longas horas de trabalho, pode contribuir para esse quadro. Colaboradores, muitas vezes, se sentem pressionados a estender a jornada para serem reconhecidos e valorizados pelos gestores, mesmo que isso não se traduza em aumento de produtividade. “Esse tipo de cultura cria ambientes onde a produtividade é inversamente proporcional às horas de trabalho, levando os colaboradores a uma espiral de cansaço e improdutividade”, complementa o especialista.
Soluções e práticas
Felizmente, muitas empresas já estão adotando práticas e rituais para evitar esse ciclo vicioso. Entre as ações recomendadas por Adeildo, destacam-se: férias de 30 dias (garantir um tempo significativo de descanso para os colaboradores, permitindo que se desconectem do trabalho e recarreguem suas energias); respeito ao tempo de almoço (promover pausas adequadas para alimentação e descanso, sem a pressão de retornar ao trabalho rapidamente): e redução das intervenções online desnecessárias (evitar reuniões excessivas e promover a comunicação eficiente e sem sobrecarga).
Além disso, é crucial que as empresas desenvolvam indicadores claros de produtividade que não dependam exclusivamente do tempo de trabalho, mas sim da qualidade e do foco nas entregas. “As organizações de alta performance compreendem que produtividade não é sinônimo de horas extras. Elas priorizam o foco durante o horário de trabalho, respeitando o ser humano e o equilíbrio entre vida pessoal e profissional”, afirma.
Papel dos Líderes
Para que essas mudanças realmente aconteçam, o papel do CEO, do líder e do gestor é fundamental. “É a liderança que deve conduzir a transformação cultural dentro das empresas, criando um ambiente saudável que valorize o descanso, o foco e o bem-estar dos colaboradores”, pontua.
Segundo Adeildo, no cenário pós-pandemia, o desafio das empresas é como construir uma cultura organizacional forte, estratégica e que valorize tanto a saúde mental quanto a produtividade real. “Evitar a produtividade tóxica é essencial não apenas para a saúde dos colaboradores, mas também para garantir uma performance organizacional sustentável a longo prazo”, conclui Adeildo.