Em decisão inovadora, TJ do Paraná garante tratamento psicanalítico à vítima de acidente de aviação

4 de setembro de 2015


 

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Em decisão sensível e inovadora, o Tribunal de Justiça do Paraná decidiu por defender o direito fundamental à saúde em seus espectros mais profundos, seguindo os preceitos da Constituição Federal. Em acórdão publicado no Diário da Justiça de 05 de agosto, cujo relator foi o desembargador D’Artagnan Serpa Sá, manteve a decisão de antecipação de tutela para o custeio de tratamento psicanalítico a um aluno de aviação pelas sequelas causadas em decorrência de acidente ocorrido na tarde de 05 de julho de 2013.

De acordo com o relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos do Comando da Aeronáutica, na referida data, uma aeronave de pequeno porte da escola de aviação Aerocom decolou do Aeródromo de Bacacheri (Curitiba-PR) com dois tripulantes para realizar vôo de instrução de navegação, com duração prevista de 3 horas, com toques e arremetida nos Aeródromos de Joinville e de Blumenau (SC).

Durante o vôo, os tripulantes perceberam que o motor apresentava oscilação. Inicialmente, a tripulação retornaria para o Aeródromo do Bacacheri; no entanto, o instrutor julgou que a direção e a intensidade do vento impediriam o pouso naquela localidade. O instrutor decidiu pousar no hipódromo e a aeronave capotou após o pouso, sofrendo danos substanciais. O relatório finaliza reportando que “o instrutor e o aluno saíram ilesos”.

“Por certo que, para efeitos técnicos, é precisa a descrição. Ilesos, todavia, para os demais efeitos, não seria a palavra. Além dos ferimentos, ainda que leves, que efetivamente ocorreram, há sequelas mais profundas a se deixar em um ser humano que passou por uma experiência traumática do que aquelas que se resumem aos danos físicos”, explica o advogado do aluno, Francisco Carlos Duarte.

E assim ressalta o laudo psicológico do processo, que comprova que:

“[…] o examinado passa por um momento de instabilidade emocional causando-lhe sofrimento psíquico e muitas vivências contraditórias. Na intenção de superar rapidamente esse trauma e poder retornar suas atividades, [o aluno] não percebe que inconscientemente tenta apagar o desconforto vivido e, o que percebemos, é a presença constante de episódios de esquecimentos de acontecimentos cotidianos. Recomendo a continuidade do tratamento psicanalítico para que o mesmo tenha percepção de suas necessidades, motivações, dificuldades e conflitos e, assim, possa lidar melhor com eles, possibilitando uma qualidade de vida mais satisfatória. Para tanto, faz-se necessário um tratamento psicanalítico durante o período mínimo de dois anos, em sessões semanais […]”..

O advogado do aluno pleiteou a antecipação de tutela para conceder ao autor a possibilidade de desde logo prosseguir com seu tratamento psicológico, antes que se veja finalizado o processo. A antecipação de tutela é ato do juiz que adianta àquele que a postula os efeitos do julgamento, ou seja, a pretensão, total ou parcialmente. Sua concessão se dá uma vez confirmados a verossimilhança da alegação e a existência de perigo na demora, através de fundado receio de dano ou no abuso do direito de defesa. A Lei nº 8.952/94 acrescentou ao art. 273 do Código de Processo Civil de 1973 a possibilidade de antecipação da tutela no curso da ação principal. No Código de Processo Civil de 2015, unifica-se o regime da antecipação de tutela e da tutela cautelar, dentro do gênero “Tutela de Urgência”.

O acórdão confirmou ser indubitável a necessidade do autor de se submeter a tratamento psicanalítico, para, ao menos, minorar seu sofrimento, não podendo esperar o provimento jurisdicional final para ver atendida as suas necessidades.

Duarte endossa o respeito ao princípio da proporcionalidade contido no acórdão: ainda que haja risco de irreparabilidade caso ao final do processo a parte autora perca a ação (negando, portanto, a ela, o direito de ter seu tratamento custeado pela empresa), quem mais poderá sofrer dano sério e de difícil reparação, neste caso, é o autor. “O que se discute é o direito fundamental à saúde, apregoado pela Constituição Federal. Já, para a empresa, as consequências seriam tão somente de caráter financeiro.”, conclui.

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