Pensador global David Stuckler fala que austeridade não é medicamento para curar crises econômicas

23 de maio de 2016


David_Stuckler_web

 

O professor inglês David Stuckler, da Universidade de Oxford e pesquisador da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, fez a palestra magna de abertura da 22ª Conferência Mundial de Promoção e Educação na Saúde UIPES, que acontece até quinta-feira (26), na ExpoUmimed, em Curitiba. Ao comentar a possibilidade de cortes no SUS anunciados pelo governo brasileiro, Sutckler lembrou os efeitos negativos das medidas adotadas por governantes que decidiram ceifar os recursos públicos do orçamento da saúde como forma de reduzir a crise econômica.

Nomeado como um dos 100 melhores pensadores globais, Stuckler garantiu que as políticas de austeridade tiveram e estão tendo efeito devastador sobre a saúde das populações da Europa e Leste Europeu, por exemplo, porque foi reduzido o acesso a atendimento médico e a remédios. “O resultado é o aumento da incidência de suicídios e de doenças infecciosas”, informou, ao reforçar que a austeridade é altamente nociva à saúde.

Imersa em uma profunda crise, a Grécia fez redução orçamentária nos programas de prevenção à Aids, que coincidiu com um aumento de mais de 200% nas infecções pelo vírus HIV desde 2011. “Isso tem como explicação também a disparada no uso de drogas, em um contexto em que o desemprego juvenil chega a 50%”, apontou. Stuckler ressaltou que o país registrou seus primeiros casos de malária em várias décadas depois de cortes nos programas de controle do mosquito transmissor. Além disso, cerca de 10 mil famílias do Reino Unido tornaram-se sem-teto por causa das medidas governamentais restritivas.

Em relação à crise no Leste Europeu, na década de 90, Stuckler afirmou que a terapia de choque do programa de privatização da Rússia e a demolição da era soviética geraram mortes e doenças. Por outro lado, a transição mais branda da vizinha Belarus manteve os níveis de saúde pública favoráveis à população.

Segundo ele, a Islândia é exemplo de que defender a saúde e os programas sociais durante a crise é acertado. Com um enfoque menos austero evitou, por exemplo, qualquer aumento na incidência de doenças, ao contrário da Grécia. Stuckler contou que após a falência dos três principais bancos comerciais, a dívida total da ilha subiu, o desemprego aumentou nove vezes e o valor da moeda local entrou em colapso. Mas, ao invés de salvar os bancos e realizar cortes no orçamento, os políticos deram um passo radical: puseram a austeridade sob voto popular. Em dois referendos, em 2010 e 2011, os islandeses votaram majoritariamente a favor do pagamento gradual aos credores internacionais e contra a política de austeridade. A economia da Islândia se recuperou bastante. Ano passado, o primeiro ranking da ONU “World Happiness Report” colocou a Islândia como uma das nações mais felizes do mundo.

“Os governadores precisam considerar as sérias, profundas e, em alguns casos, devastadoras consequências das escolhas econômicas, principalmente, a redução de recursos públicos à saúde”, alertou. Para Stuckler três princípios básicos devem ser levados em conta pelos governantes em relação à austeridade financeira. A diretriz econômica adotada não pode fazer mal à população; criar programas de ajuda e recuperação das pessoas e suporte para que retomem o emprego, e, o mais importante, investimentos em saúde pública. “A prevenção é sempre mais barata do que o tratamento. Por exemplo, a Grécia está gastando muito mais para controlar epidemias do que com os programas de redução de custos na saúde”, disse.

Stuckler afirmou que, mesmo no pior desastre econômico, os efeitos negativos sobre a saúde pública não são inevitáveis e dependem fortemente da gestão política. Para ele, apenas um sistema justo e equitativo e acompanhado de políticas inteligentes fortalece as redes de segurança pública e assegura o bem-estar das populações.

Contato